Apresentando nossa causa diante de Deus
Jeremias pregou um sermão poderoso (Jeremias 19), um
"peso" de Deus para o povo. Por causa do seu pecado, de ter cultuado
a Baal e sacrificado seus filhos perante este deus repugnante, os israelitas
seriam quebrados como um pote de barro. Cumprindo ordens expressas de Deus e
para ilustrar a mensagem, Jeremias pegou um vaso de barro e o quebrou em vários
pedaços. O povo deve ter ficado impressionado.
Numa tentativa de o deter, o supervisor dos assuntos
religiosos da época, de nome Pasur, ouviu este sermão e mandou dar uma surra em
Jeremias, que ficou preso por 24 horas no tronco da prisão.
Neste momento doloroso, Jeremias faz uma estranha oração
(Jeremias 20.7-12 -- VAM).
A CONDIÇÃO
DE JEREMIAS
O profeta Jeremias falava o contrário do que o povo queria
ouvir.
As pessoas queriam ouvir uma mensagem politicamente correta
e bem adocicada: de que Deus amava a todos e não iria permitir que lhes
alcançassem as consequências dos seus pecados. O povo queria ouvir que podia
seguir a qualquer deus, que o verdadeiro Deus não se importaria. O povo queria
ouvir que podia fazer o que bem entendesse, que Deus daria um jeito de o
abençoar.
O que Jeremias dizia era refutado como sendo algo inaceitável.
À sua mensagem o povo reagia com zombaria. Além da zombaria, o profeta tinha
que enfrentar ameaças de morte. Outros estavam de olho nele esperando que
cometesse algum deslize para o desmoralizar.
A
RECLAMAÇÃO DE JEREMIAS
Jeremias reclama: ele prega exatamente como Deus lhe pede e
apanha (literalmente) por isto. Aborrecido e confuso, o profeta, então, toma
uma decisão. Podemos imaginar que tenha dito no seu coração: "Não vou
pregar mais, não vou anunciar o amor de Deus para este povo. Eles é que arquem
com os salários dos seus pecados. Lavo as minhas mãos. Fiz a minha parte".
No entanto, tal é o seu amor por Deus que não consegue se
calar. O nome de Deus (isto é: Deus mesmo) lhe arde no coração e brota
naturalmente dos seus lábios.
Os apóstolos Pedro e João, na manhã do Cristianismo,
entenderam isto quando, proibidos de pregar sobre Jesus, recusaram colaborar,
informando arriscadamente às autoridades: "não podemos deixar de falar do
que temos visto e ouvido" (Atos 4.20). Quando flagrados pregando pelas
mesmos donos do poder que lhes questionaram, responderam com redobrada ousadia:
"Mais importa obedecer a Deus do que aos homens" (Atos 5.29).
A
ATITUDE DE JEREMIAS
Em lugar de se recolher, Jeremias volta a falar do que tem
visto e ouvido. Não olha mais para os seus inimigos. Ele não consegue não
obedecer a Deus.
Não olha mais para os seus problemas. Ele olha para Deus. E
se enche de uma convicção: "Deus está comigo" (verso 11). Deus está
do meu lado -- eis a sua confiança.
Jeremias, então, olha para Deus como o que Deus é: Senhor
dos Exércitos (verso 12). Esta expressão, própria da cultura da época,
significa "comandante em chefe das forças armadas" ou simplesmente
"o guerreiro mais valente". Jeremias enfrenta inimigos que se opõem a
Deus, mas Deus, que ele vê como um "poderoso valente", vai lutar por
ele e sabe de antemão quem vencerá.
O olhar de Jeremias para Deus faz toda a diferença e enche o
seu coração de coragem. O que ele enfrentava demanda coragem. O que ele
enfrentaria demandaria coragem.
Quando lemos as páginas seguintes do livro que leva seu
nome, notamos que Jeremias viveu na certeza que Deus estava ao seu lado.
QUANDO
SOMOS JEREMIAS, QUE FAZER?
Se estivermos sendo afligidos por inimigos, devemos buscar a
solução que Jeremias encontrou. Na cultura hebraica, bastante concreta, não se
pensa, como nós, em "problemas". Os hebreus preferiam pensar em
inimigos de carne e osso. Os salmos estão cheios de orações por livramento de
inimigos. Podemos entender a palavra assim e podemos ampliá-la para incluir
todo tipo de problemas, sejam de pessoas ou de situações que nos fustigam e
fazem sofrer.
Como Jeremias resolve o seu problema? A resposta é bastante
simples: Jeremias ora.
Eis como devemos resolver nossos problemas: orando.
Como orar? Além dos ensinos de Jesus, temos mais de 220
orações de pessoas reais que colocaram suas causas diante de Deus. Ler estas
orações é uma escola para nós.
O que aprendemos com a oração deste profeta?
1. Aprendemos que a situação de Jeremias encontra paralelo
na condição da Igreja Cristã em todos os tempos e também nos dias que correm,
tanto naqueles países onde os cristãos são perseguidos formalmente quanto
naqueles (como o nosso) em que os cristãos são rejeitados não por
comportamentos reprováveis (merecidamente nestes casos! que vergonha!) mas pela
mensagem que pregam.
Qual é a origem do nosso problema?
Ele vem de nossa fidelidade a Deus ou vem de nossa
infidelidade a Deus?
Ele vem de causas que não sabemos, de coisas que não
fizemos?
Precisamos responder honestamente a estas perguntas.
Se nosso sofrimento vem de nossa fidelidade a Deus, em forma
de perseguição, rejeição, ou ameaça, oremos a Deus para nos dar força para enfrentar
o Pasur que nos ataca.
Se nosso sofrimento vem de nossa infidelidade, só resta
pedir perdão a Deus, junto com uma unção para ficarmos firmes.
Se nosso sofrimento vem de inimigos que não conhecemos,
peçamos ajuda a Deus para nos libertar destes flagelos.
Se for uma doença, para a qual não concorremos, peçamos a
cura.
Se for uma doença com a qual contribuímos, peçamos o perdão
e a cura a Deus.
2. Aprendemos que precisamos ser honestos em nossas orações.
Se formos sinceros com as pessoas (em posição de chefia ou não), pode ser que
não nos compreendam e até nos punam. Bem diferentemente, Deus sempre nos
compreende e podemos abrir os nossos corações diante dele.
Ele não quer que oremos, em particular, procurando palavras.
Não quer que pisemos em ovos. Não quer orações melosas. Não quer puxa-sacos.
Quer corações contritos e verdadeiros, respeitosos, mas verdadeiros.
Se está doendo, gritemos: "Senhor, está doendo".
Moisés gritou assim: "Agora, pois Senhor, perdoa o pecado deste povo;
"se não, risca-me, peço-te, do teu livro, que tens escrito" (Êxodo
32.32). Elias desesperou-se assim: "Já basta, ó Senhor; toma agora a minha
vida, pois não sou melhor do que meus pais" (1Reis 19.4). Jonas reclamou
assim: "Peço- te, pois, ó Senhor, tira-me a minha vida, porque melhor me é
morrer do que viver" (Jonas 4.3). Jesus bradou assim: "Deus meu, Deus
meu, porque me desamparaste?" (Mateus 27.43)
Oremos como estes homens. Oremos como Jesus.
3. Aprendemos que, diante dos problemas, devemos olhar menos
para eles e mais para Deus. Enquanto os problemas nos olham, devemos olhar para
Deus. É Deus quem deve fazer arder o nosso coração, não pessoas, coisas, causas
ou problemas.
O problema de Jeremias era imenso. Seu chefe religioso -- o
sacerdote Pasur, filho do sumo-sacerdote Imer -- queria que ele mudasse a
mensagem.
Autorizado por seu pai, tinha poder para o torturar e prender, como o
fez. Seu chefe político, o rei Zedequias, estava desgostoso, porque o profeta
só falava de desgraça. Por isto, tentava alugá-lo para mentir. Seus assessores
de marketing não podiam contar com uma palavra sequer para motivar o povo. A
vida de Jeremias estava nas mãos do sistema religioso e político.
Jeremias não olhou para Pasur. Jeremias não olhou para
Zedequias. Jeremias olhou para Deus. Jeremias teve raiva deles. Teve: mas
entregou o destino deles a Deus. Precisamos ter a coragem de entregar o destino
dos nossos problemas a Deus. Ele dará um jeito nele, que nós não saberemos dar.
Como perdoaremos a quem nos ofende, se não for Deus a
perdoá-los por nós?
Como enfrentaremos as nossas enfermidades, se Deus não
estiver do nosso lado?
Como termos forças para enfrentar as perseguições, se Deus
não nos fortalecer?
Como cantaremos como Silas e Paulo [...] se Deus não puser em nossos lábios as canções?
Como Jeremias, precisamos confiar a Deus as nossas causas,
sejam quais forem.
***
Devemos orar como Jeremias orou, entregando a Deus as nossas
causas.
Israel Belo de Azevedo